Sabemos que os distúrbios de humor podem influenciar física e emocionalmente a vida de um indivíduo e são tratadas prioritariamente com uso de drogas que manipulam o sistema neurotransmissor monoaminérgico a nível cerebral. O uso dessas drogas vêm sendo questionadas pela baixa adesão e atraso no início de resposta. Seria a nutrição e o eixo intestino-cérebro-microbiota um novo paradigma para esse problema? O chocolate meio amargo já é amplamente reconhecido por suas propriedades nutricionais, mas teria o cacau alguma propriedade influenciadora sobre o humor?
Um estudo buscou avaliar o papel de compostos nutricionais presentes no cacau, principalmente os polifenóis, como manipulador do eixo intestino-cérebro-microbiota e uma possível estratégia regulatória de humor. O estudo foi randomizado e controlado separado em 3 grupos: grupo controle (CON / n=14), grupo chocolate 70% cacau (DC70 / n=16) e grupo chocolate 85% cacau (DC85 / n=18).
Os grupos de intervenção DC70 e DC85 foram instruídos a consumir 10g de chocolate, três vezes ao dia, nos mesmos horários das 07:00 as 09:00, das 12:00 as 14:00 e das 17:00 as 19:00h, durante 3 semanas. Os participantes tinham entre 20 e 30 anos e foram excluídos os que (1) Comiam guloseimas rotineiramente, como balas, chocolates ou bolos, mais de duas vezes ao dia; (2) Tiveram história de cirurgia ou doença do trato gastrointestinal; (3) Receberam antibióticos nos 3 meses anteriores ao estudo; (4) Tomaram pré-/pró-bióticos nos 6 meses anteriores ao estudo; (5) Tinham diabetes; (6) Tinham pontuação no Inventário de Depressão de Beck (BDI), elegendo 48 de 117 participantes.
Foram feitas análises da microbiota intestinal através do DNA presente em amostras de fezes coletadas e realizado teste de alteração de humor em dois programas, o Programação de efeitos positivos e negativos (PANAS) e o Inventário de Depressão de Beck (K-BDI) antes e depois do estudo para avaliar os efeitos do chocolate sobre a hipótese levantada, além disso, a dieta e composição corporal também foram avaliadas através de recordatório alimentar de 3 dias e bioimpedância.
Dos dados coletados:
- Dos dados dos participantes, o sexo (p=0,903), idade (p=0,603), peso (p=0,603), IMC (p=0,447), massa muscular esquelética (p=0,592), massa de gordura corporal (p=0,447) e percentual de gordura (p=0,927) não apresentaram diferenças significativas nos três grupos avaliados (CON, DC70 e DC80);
- Não houve diferença significativa entre o consumo de calorias, proteína, carboidrato e gordura entre os três grupos, estando os participantes igualmente distribuídos.
Os pesquisadores avaliaram que o consumo de chocolate amargo não teve impacto no afeto positivo avaliado pelo PANAS relacionado ao humor (p=0,498), mas o afeto negativo foi significativamente alterado pelo consumo. O grupo DC85 mostrou uma diminuição significativa no afeto negativo (p=0,029), enquanto a mudança no afeto negativo após a intervenção não foi significativamente diferente no grupo DC70 em comparação com o grupo CON. Os resultados mostraram que houve uma maior abundância do filo Blautia, significativamente associado a mudanças positivas nos escores de humor e menor abundância do filo Faecalibacterium prausnitzii, correlacionado negativamente com o humor, no grupo DC85.
Os autores concluíram que a dose de cacau pode promover efeitos melhoradores de humor, sendo os efeitos mais notáveis com a administração do chocolate 85% de cacau, sugerindo que há um efeito prebiótico auxiliando a reestruturação da microbiota intestinal, que por sua vez, pode melhorar o eixo-intestino-cérebro e refletir na melhora do humor.
